28.10.08

CORTEM-ME A CABEÇA

Um fiapo curto de luz entra pela janela aquecendo as pálpebras adormecidas. Anúncio do despertar, colocar-se de pé, renegociar com o alicerce do ego.

Um naco de esperança de que esse dia será o melhor, porque é o dia da conclusão.

Os olhos impacientes, vidrados na tela azul do computador que também se inicia.

Primeira letra, primeira sílaba, primeiras palavras, brotam contínuas, até que se perfazem três laudas, uma cacetada de caracteres e uma releitura para saber em que pé estamos.

Na cabeça as idéias não param. Se fosse somente por ela, não fossem as críticas, as licenças poéticas, dar poder, dar força ao texto, estaria o livro concluído como um balaio de gato.

Não fossem as releituras e seus cortes intrínsecos, teria muito além de três míseras laudas, mui ralas para exprimir mais do que uma rusga de um livro perfeito que carrega em sua cabeça gorda. O consciente delata mais algum corte, reescreve.

Os olhos espreitam o relógio que cutuca com as horas, como se houvesse um tempo determinado para exprimir a exata medida, a frase perfeita dentre outras tantas milhões de frases, que percorrem do dedo do pé até o último fio de cabelo.

Pregada à cadeira, colada na gosma da lesma, que enxerga o mundo com olhos de vidro, coisas que não são pertinentes ao mundo real, mas que precisam ser ditas, de tanto observar são mais reais a mim do que a qualquer outro.

Vazio, melancolia, o choro, não há verdade absoluta, o que expresso é temporário, não consigo parar o tempo, não consigo parar as idéias, é pobre a maneira de expressar, ainda não é exímia à maneira de preencher o branco da folha, precisa de mais, mais vivência, mais ciência, mais poesia, mais insônias.

Salvo o texto, mas não o salvo do sentimento inquisidor, da frustração inconclusa, do grito contido pela idéia que precisa, mas ainda não pôde ser repassada adiante. Resta a folha vazia, a idéia manca, os olhos inchados, e a soberba de que vou insistir até preencher a última página, da última folha do último capítulo.

Um comentário:

Unknown disse...

o NOSSO PROBLEMA É QUE O LIVRO PERFEITO SEMPRE ESTÁ NA CABEÇA E NUNCA NO PAPEL...